O Estouro da Bolha Virtual – Quando as Redes Sociais Confrontarem o Mundo Real
- Matheus Ussam
- 11 de jan.
- 7 min de leitura

O Estouro da Bolha Virtual – Quando as Redes Sociais Confrontarem o Mundo Real
Chegamos a 2025, imersos em um cenário onde o mundo virtual domina cada vez mais nossa rotina e percepção. As redes sociais se consolidaram como epicentros de interação, prometendo conexão, reconhecimento e uma realidade onde tudo parece ideal. Contudo, esse universo digital, que frequentemente exibe uma versão filtrada e perfeita da vida, já dá sinais de saturação e colapso.
Quando essa bolha virtual inevitavelmente estourar, muitos se depararão com as consequências de viver em uma ilusão prolongada. Será necessário um retorno à realidade, onde novas formas de adaptação e enfrentamento serão essenciais para lidar com um mundo que exige autenticidade e resiliência.
A Bolha Virtual: Um Reflexo da Utopia de um Mundo Perfeito
As redes sociais são frequentemente descritas como um "mundo perfeito", onde vidas são meticulosamente moldadas, emoções são amplificadas para engajamento, e dificuldades reais são escondidas sob camadas de filtros. Empresas como a Meta, liderada por Mark Zuckerberg, continuam investindo em uma imersão cada vez mais profunda nesse universo ilusório. Em 2025, buscando atender aos desejos pessoais dos usuários, a empresa rompeu protocolos de regulação sobre a veracidade das informações compartilhadas em suas plataformas.
Essa realidade virtual, agora menos regulada e comparada ao caos de um Velho Oeste digital, intensifica a comparação constante entre os usuários e alimenta a busca incessante por validação externa. Como resultado, ansiedade, depressão e um distanciamento crescente da realidade são cada vez mais prevalentes, reforçando os efeitos nocivos dessa dinâmica para a saúde mental.
Certa vez li algo de Byung-Chul Han em A Sociedade do Cansaço, que falava sobre a hiperconexão digital e a promoção da auto cobrança extenuante, onde as pessoas precisam estar constantemente disponíveis, produtivas e felizes – uma tarefa que nenhum ser humano é capaz de sustentar indefinidamente e o cansaço que isso causaria na mente, o que podemos concluir que causa danos e leva as mais diversas condições de sofrimento psicológico. Mas quais os impactos desta bolha?
Ansiedade e Depressão: Muitos tratam a ansiedade e a depressão como "modas" do mundo digital, mas esse olhar desdenhoso ignora que o termo "moda" pode, neste caso, ser substituído por "surto", e não de maneira pejorativa. Pesquisas indicam que o uso excessivo de redes sociais está diretamente associado ao aumento de sintomas de ansiedade e depressão, especialmente entre jovens.
Esse fenômeno não é coincidência: estudos mostram que cursos relacionados à interação digital estão entre os mais procurados, indicando como as redes têm moldado tanto o comportamento dos usuários quanto a demanda profissional. Antigamente, profissões ligadas à tecnologia visavam otimizar processos empresariais. Hoje, o foco são as pessoas — transformadas em consumidores digitais contínuos, o que gera sofrimento tanto para os usuários quanto para os profissionais responsáveis por manter as plataformas em funcionamento. A demanda constante exige disponibilidade ininterrupta, criando um ciclo de pressão e desgaste psicológico.
Esse cenário revela como as redes sociais impactam profundamente a saúde mental, exigindo atenção e práticas de autocuidado para minimizar seus efeitos negativos.do.
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Sensação de Inadequação: A comparação com vidas aparentemente perfeitas leva à sensação de insuficiência, diminuindo a autoestima. Muitas vezes observamos alguns influenciadores (palavra nefasta nos dias de hoje) mostrando a realidade em que vivem, mas na imensa maioria dos casos é a falsa verdade criada pelo roteiro que produziram para seus personagens que vedem essa realidade absurda e comparativa que solapa cada espaço de autopercepção possível.
Fragmentação Psíquica: Como descrito por Jacques Lacan, a exposição constante a imagens idealizadas nas redes sociais fragmenta a percepção do "eu", criando um "self virtual" desconectado do self real. Esse "self virtual" não é apenas uma máscara social ou um avatar, mas uma nova construção psíquica que pode sustentar ilusões e distorções por anos, muitas vezes sem ser questionada.
Uma de suas características mais marcantes é a liberdade de projetar versões idealizadas ou distorcidas de si mesmo, frequentemente resultando em consequências inesperadas. Mesmo quando há a intenção de criar uma persona melhor ou mais atraente, os efeitos colaterais podem ser devastadores, incluindo desconexão emocional, crises de identidade e sentimentos de inadequação.
Essa dinâmica pode ser comparada ao Transtorno Dissociativo de Identidade, popularizado no filme Fragmentado, de M. Night Shyamalan, onde diferentes personalidades coexistem em conflito. O "self virtual" opera de maneira semelhante, criando um estado psíquico fragmentado que pode dificultar a reconexão com o self real.
Refletir sobre o processo de destruição dessa realidade falsa é essencial para compreender o impacto psicológico das redes sociais e como elas moldam nossa relação com o mundo e com nós mesmos.
E Quando a Bolha Estourar
Assim como qualquer sistema que se expande além de seus limites, a bolha da perfeição digital está à beira de estourar. Quando digo “à beira”, não estou sugerindo um evento apocalíptico, mas sim um ajuste inevitável. Essa ruptura, como toda grande mudança, trará consequências significativas, especialmente no âmbito das próximas eleições ou durante os mandatos decorrentes.
Fadiga Digital
O impacto nocivo das redes sociais na saúde mental está cada vez mais evidente. A busca por terapias e cursos relacionados a saúde mental tem crescido exponencialmente, com a psicologia figurando como uma das áreas mais procuradas em exames como a FUVEST. Essa tendência reflete a necessidade de romper com a imagem idealizada promovida nas plataformas digitais. Quando a bolha estourar, provavelmente veremos uma debandada de usuários e o abandono de influenciadores que não oferecem valor real.
Movimentos como a breve ascensão do Threads, concorrente do X/Twitter, ilustram como as pessoas buscam novas experiências digitais mais autênticas, mesmo que o entusiasmo inicial muitas vezes seja corroído pelo retorno à mesmice.
Desconfiança nas Plataformas
O aumento de fake news, algoritmos manipulativos e violações de privacidade têm alimentado um ceticismo crescente em relação às redes sociais. É como se o "inconsciente virtual" de nossos avatares fosse explorado por mecanismos de busca e dispositivos que registram cada movimento digital. A aceitação compulsória de termos de privacidade e o treinamento contínuo de IAs através das redes mostram que os usuários têm pouco controle real. Para alguns, a solução é se afastar dessas plataformas, mas outros preferem ignorar esses fatos, perpetuando o ciclo de manipulação.
Busca por Autenticidade
A valorização da desconexão digital e da vida offline está ganhando força. Um exemplo marcante é o da jornalista e youtuber Jout Jout, que há anos abandonou suas redes sociais para “viver a vida”. Essa decisão reflete a essência de ser autêntico: priorizar experiências reais e genuínas. Assim como o retorno de fitas K7 e discos de vinil, a nostalgia por um mundo analógico também reflete o desejo de escapar da saturação digital e da superficialidade das redes. A autenticidade nunca deixou de ser admirável, mas, no mundo hiperconectado, ela se torna ainda mais valiosa quando é verdadeira, e não apenas uma performance para ser exibida online.
A bolha da perfeição digital não só vai estourar, como também exigirá uma reavaliação das nossas relações com o mundo virtual. O futuro dependerá de nossa capacidade de encontrar equilíbrio entre o online e o offline, valorizando a autenticidade e criando conexões reais.
Quando essa ruptura acontecer, as pessoas precisarão confrontar a realidade que negligenciaram. Trabalhos exigirão resiliência e habilidades reais, relacionamentos dependerão de interações genuínas, e o tempo deixará de ser preenchido por rolagens infinitas em telas. Hoje estamos vivendo um mundo de comparações instantâneas, o que antigamente só acontecia em reuniões de família aos domingos: relacionamentos ganham indiretas com vídeos humorísticos genéricos e muitas vezes sem graça, stand up que deveria ser um movimento social acaba sendo uma esquete de rede social, como se a ida ao banheiro ou o pré-sono fosse parte de uma programação televisiva. O que era lido nos jornais e debatido na pausa do café hoje é compartilhado nos mundos virtuais e marcado, cada qual liturgicamente no vídeo, como se fosse um debate. Gargalhamos sem sorrir, choramos sem lágrimas. Nossos sentimentos passaram para a tela enquanto o corpo desconectado da realidade sofre as intempéries do tempo.
O Papel da Psicanálise no Retorno ao Real
Obviamente não me faço de rogado e trago essa percepção ao tema. A psicanálise oferece uma abordagem única para lidar com as consequências do estouro dessa bolha. Posso afirmar que dentro da clínica este vício (primeira vez que vou tratar da adicção em redes sociais de forma mais clara neste texto) tem todos os aspectos e estágios de uma intoxicação e desintoxicação. Ao explorar os mecanismos inconscientes que levaram à alienação digital, ela ajuda indivíduos a correlacionar os mundos real e virtual e entender os motivos que levam ao sofrimento fora das redes e das falsas verdades. A necessidade de reconstrução de uma identidade baseada, obviamente, no self real que ainda pode estar mascarado por um falso self criando ainda na infância e a tão conhecida resiliência e seu desenvolvimento para a realidade incontrolável que tentamos manter no 5g. Essa discussão sequer é nova: Como Freud destacou em O Mal-Estar na Civilização, o ser humano sempre estará em tensão com o ambiente ao seu redor. No entanto, encontrar formas saudáveis de adaptação é essencial para viver uma vida plena. Enquanto não entendermos que redes sociais virtuais devem ser um complemento de uma rede social palpável, estaremos nos distanciando uns dos outros a ponto de não tolerarmos a convivência real.
O Desafio do Pós-Digital
O estouro da bolha virtual será um momento de ajuste e crescimento. Para muitos, ele trará desafios, mas também uma oportunidade de reconstruir suas vidas fora das lentes digitais. Será necessário um equilíbrio entre o uso consciente das redes sociais e a valorização de conexões autênticas e experiências reais.
Ao nos prepararmos para esse retorno ao real, precisamos investir em práticas que promovam saúde mental e emocional, como terapia, autoconhecimento e a construção de relações significativas. O futuro pode ser menos digital, mas certamente mais humano. As redes sociais não são um mal, mas estão sendo usadas para tal. O que antes era uma piada, "se vocês soubessem o que aconteceu na final da copa do mundo de 1998 ficariam enjoados", as pulhas virtuais se tornaram um grande mecanismo, uma viagem de ácido lisérgico por um mundo muito melhor, mas inatingível e inacessível fisicamente, onde tudo que se adquire se torna pó quando o celular vai parar no carregador. O Estouro da Bolha Virtual – Quando as Redes Sociais Confrontarem o Mundo Real
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